Recentemente um produtor rural foi autuado pela suposta prática de trabalho infantil. E se não fosse a lealdade dos seus parceiros ele pagaria uma multa de quase R$1MM.
Na zona rural é comum os filhos acompanharem os seus pais no cuidado com a terra sem que isso traga alguma penalidade para os seus filhos. As crianças estudam pela manhã e, às vezes, vão à roça observar ou até mesmo participar de alguma atividade que seja pertinente à sua idade.
E fico confusa quando leio que uma decisão da Justiça Federal no Rio Grande do Sul tornou possível que brasileiros que começaram a trabalhar ainda na infância tenham esse período de serviço reconhecido na hora de se aposentar.
E é claro que o INSS vai recorrer embora me questiono por que é permitido o trabalho infantil em novelas, em desfiles, em propagandas e não é permitido uma criança de mesma idade aprender um ofício com o pai. A incoerência reina em nosso país.
A semana passada estive no sapateiro, coisa cada vez mais rara nas grandes cidades, e ouvi o dono do estabelecimento me informar que esse e tantos outros ofícios estão em extinção, pois os filhos e netos não podem aprender o seu exercício. Se a justiça do trabalho identifica esse tipo de situação o estabelecimento é autuado. E todos os dias vemos cenas tão absurdas na televisão com a participação infantil e nunca ouvi falar que alguma rede de televisão foi autuada.
Penso que há informações confusas, pelo menos assim me deixou, quando pesquisei sobre o assunto. O Estatuto da Criança e do Adolescente no Artigo 60 diz que é proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. Eu não sei se sou eu que não soube interpretar o artigo, para mim ele informa que toda criança abaixo de 14 anos pode trabalhar desde que na condição de aprendiz. O que é um absurdo também, pois não estabelece uma idade mínima.
A Constituição Federal considera menor trabalhador aquele na faixa de 16 a 18 anos (artigo 7º, inciso XXXIII). Na CLT, a idade mínima prevista é de 14 anos, desde que o menor seja contratado na condição de aprendiz – que exige diversos requisitos a serem observados pelo empregador, como o contrato de aprendizagem, a jornada de trabalho, as atividades que podem ser exercidas e a inscrição do empregador e do menor em programa de aprendizagem e formação técnico-profissional.
Essa falta de clareza e de orientação, principalmente aos microempreendedores gera essa insegurança e se evita qualquer interesse em levar conhecimento e aprendizado para crianças e adolescentes.
Uma coisa é o trabalho infantil que explora uma criança, que retira os seus direitos de brincar, estudar e descansar. Outra coisa é uma atividade que desperta o interesse da criança, que possui uma curiosidade nata em conhecer e em aprender, acompanhada por um adulto que deve incentivá-la à leitura, aos estudos e proporcionar aprendizado e muitas vezes a preservação de um legado familiar.
Infelizmente o que constatamos hoje são jovens desestimulados para o estudo, um modelo educacional ultrapassado, com muita teoria, pouca prática e que por falta de atividades se envolvem cedo com drogas e atos ilícitos.
Medellin na Colômbia conseguiu reduzir drasticamente o tráfico de drogas não só por conta da morte do Pablo Escobar e com políticas voltadas para a educação, cultura e reurbanização.
As nossas crianças precisam aprender brincando para que tenham valores morais e éticos bem consolidados. Vamos exigir que o tanto de impostos que pagamos sejam de fato direcionados para a educação e saúde das nossas crianças o que vai nos garantir um país saudável e sustentável.
Artigo publicado no jornal Diário de Ilhéus em 25 de maio de 2018.