Há algum tempo venho sentindo um desconforto com a palavra desenvolvimento o que me fez refletir aleatoriamente sobre a palavra. O prefixo Des nos remete à falta, a falta de, o que me faz concluir a falta de envolvimento. Então me pergunto: o desenvolvimento da forma que foi constituído em nossa sociedade provocou uma falta de envolvimento humano nas questões que nos dizem respeito?
Pesquisando sobre a etimologia da palavra, por coincidência ou sincronicidade, encontrei um artigo na revista eletrônica do programa de mestrado em desenvolvimento regional da Universidade de Contestado, cujo o título é Desenvolvimento: um conceito multidimensional[i], que traz uma reflexão bastante interessante sobre o conceito na sociedade capitalista.
A primeira seção do artigo se refere a gênese da palavra desenvolvimento onde os autores fazem a seguinte reflexão adaptada de um outro autor: des (prefixo de negação ou ausência), en (do latim in) movimento para dentro, volver (do latim volvere) reverter, virar e mento é um sufixo que significa ação. Ou seja, sem envolvimento. Sem movimento para reverter a ação.
Sabemos que a Biologia é quem traz a origem do conceito desenvolvimento como um processo de evolução, transformação para o alcance da maturidade biológica e ao longo do tempo foi-se incluindo o movimento de autoconhecimento para processo evolutivo de uma sociedade.
Com o evento da Revolução Industrial, no século XVIII, a substituição gradativa do trabalho humano para o mecanizado foi imensurável e fomos perdendo o envolvimento do homem que ficou, de fato, sem movimento para reverter essa ação e as relações humanas foram se distanciando em função do próprio processo de mecanização.
E esse processo crescente de falta de envolvimento humano, para mim, trouxe um grande impacto em nossas relações. As pessoas pouco se encontram, pouco se abraçam, o verbo namorar foi substituído pelo ficar e o namorar já se tornou algo mais sério.
E quanto mais os anos passam mais sinto falta dos encontros para tomar um café e prosear. Isso pertence a minha geração. Os jovens já não querem ir às ruas lutar pelos seus direitos, são poucos desejosos de se envolver nas questões que dizem respeito ao seu futuro permeados pelo medo.
Em muitos momentos tenho vontade de que tudo fosse como antes, onde os encontros e envolvimentos eram constantes e intensos e todos se punham em ação. Portanto, quero ser alguém que contribui para o envolvimento humano.
Como creio que a palavra tem força, há algum tempo venho me referindo ao envolvimento humano ao invés de desenvolvimento para que se reflita sobre esse aspecto. O quanto cada vez mais estamos nos distanciando ou deixando de nos importar com aquilo que nos envolve e nos diz respeito.
O envolvimento nos convida para envolvermos conosco e com o outro. Traz um olhar para o coletivo, para nos engajarmos em ações que possam beneficiar a todos trazendo abundância e prosperidade. Nos tira da escassez, quando temos muitas pessoas envolvidas em um processo de construção e da crença de que não há para todos e como não há para todos preciso garantir o meu.
Não temos garantia de nada e, portanto, precisamos nos envolver agora para que o presente das gerações seguintes seja de fato recebido como um presente e honrado como um legado que deixamos para todos.
Vamos precisar de todo mundo, prá banir do mundo a opressão, para construir a vida nova, vamos precisar de muito amor e envolvimento.
[1] LEAL, Ednaldo; BRAGA, Vitor; SOUZA, Reginaldo; BRAGA, Alexandra. Desenvolvimento: um conceito multidimensional, 2012. Disponível em: https://www.researchgate.net/scientific-contributions/2066465342_Reginaldo_Souza.
Artigo publicado no jornal Diário de Ilhéus em 15/06/2018 e no blog do Thame em: http://www.blogdothame.blog.br/v1/2018/06/16/desenvolvimento-ou-envolvimento/#more-77798